Jurisprudência: disputa por domínio de internet

Hoje o Blog >Evolução Tecnológic@_ inaugura a categoria “jurisprudência”, que conterá decisões dos tribunais em matéria de direito eletrônico.

A jurisprudência de hoje trata da disputa pelos domínios de internet: jornalnacional.com.br e globoesporte.com.br

A informação é pública, boa leitura!

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 177.289-4/0-00, da Comarca de SÃO PAULO, em que são apelantes e reciprocamente apelados FUNDAÇÃO DE AMPARO A PESQUISA DO ESTADO DE SAO PAULO FAPESP, REGIÃO EDITORA LTDA (ATUAL DENOMINAÇÃO) E TV GLOBO LTDA:

 

ACORDAM, em Sexta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “DERAM PROVIMENTO AO APELO DE FUNDAÇÃO DE AMPARO A PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO – FAPESP, DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DE M.L. EDITORA SUL BAIANA DE JORNAIS E REVISTAS LTDA. E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA, V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que íntegra este acórdão.

 

O julgamento teve a participação dos Desembargadores VITO GUGLIELMI (Presidente), PERCIVAL NOGUEIRA.

 

São Paulo, 22 de novembro de 2007.

MAGNO ARAÚJO – RELATOR

Apelação com Revisão n° 177 289 4/0-00 – SÃO PAULO

Aptes e Apdos FUNDAÇÃO DE AMPARO À PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO – FAPESP, A REGIÃO EDITORA LTDA e TV GLOBO LTDA

 

EMENTA:

OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS INTERNET REGISTRO DE NOME DE DOMÍNIO ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS E PROPRIEDADE INTELECTUAL PRINCÍPIO DA PRECEDÊNCIA QUE NÃO SERVE PARA ENCOBRIR EVENTUAIS REGISTROS QUE PREJUDIQUEM DIREITOS DE TERCEIROS PROTEGIDOS PELO ORDENAMENTO JURÍDICO EXCLUSÃO DA FAPESP DO POLO PASSIVO MERO ÓRGÃO DE REGISTRO DE NOME DE DOMÍNIO PRECATÓRIA NÃO INSTRUÍDA COM CÓPIA DA PETIÇÃO DE EMENDA À INICIAL MENCIONANDO EXPRESSAMENTE O VALOR ALMEJADO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS APURAÇÃO REMETIDA À LIQUIDAÇÃO POR ARTIGOS DANOS MORAIS NÃO CONFIGURAÇÃO. RÉ QUE SEQUER CHEGOU A USAR OS NOMES DE

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por ato ilícito, julgada parcialmente procedente pela r sentença de fls 253/262, cujo relatório adoto

 

Embargos de declaração rejeitados a fls 282 e declaratórios acolhidos a fls 286

 

Três os apelos

 

A co-ré Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado Paulo – FAPESP- sustenta descabido o enquadramento da determinação para cancelamento dos registros de domínio como condenação por inexistir litígio com a TV Globo Ltda e existir cláusula de não indenizar Aduz, outrossim, ser parte ilegítima para figurar no pólo passivo, vez que a legislação aplicável isenta de responsabilidade o “registro br”, imputando responsabilidade apenas ao requerente do registro do “nome de domínio” Enfatiza que o “registro br”, por delegação de competência do Comitê Gestor, conforme Resolução n° 002/98, apenas procede ao registro dos nomes de domínio a pedido do interessado, sendo certo que não assume qualquer responsabilidade com terceiros por fato ocorrido de natureza registraria, vez que o registro é feito por ordem, determinação de quem o pleiteia e que deve responder por eventuais danos causados a terceiros Em resumo, assevera que a responsabilidade pelo registro questionado cabe exclusivamente à co-ré ML Editora de Jornais e Revistas, sendo a atuação concernente ao registro de nomes de domínio e atribuição de IPS da competência do “REGISTRO BR” como mero interessado e não haver como acionar, com escopo indenizatório, o órgão investido de função registraria de nome de domínio tendo presente sua competência legal de apenas proceder ao depósito (fls 294/311)

 

A co-ré Região Editora Ltda sustenta a preliminar de nulidade do processo a partir da citação, porquanto não instruída a precatória com cópia da petição de aditamento à inicial, prejudicando seu direito de defesa No mérito, bate-se pela inversão do julgado sustentando que a autora reivindica proteção e precedência sobre marca da qual não tem o registro correspondente, consoante provado nos autos Enfatiza, ainda, que a autora não tem para o nome “Globoesporte” o respectivo registro no INPI, registro que se deferido não confere o atributo de notoriedade em classe especial, mas sim proteção única e específica nas áreas que solicitou, ligadas ao telejornalismo Em síntese, aduz que o nome “Globoesporte” era de domínio público quando do cadastramento do respectivo nome de domínio na FAPESP e que ainda que a apelada tivesse a titularidade das marcas regularmente registradas no INPI, improcedente seria o pedido por se tratar de marcas comuns, amparadas apenas nas classes em que estão registradas No mais, enfatiza que mesmo uma marca registrada não confere automaticamente direitos ao uso do nome como um endereço na Internet, porquanto adotado pelos órgãos de registro do domínio o princípio “first come, first served”. Subsidiariamente, sustenta que a indenização por danos materiais foi deferida aleatoriamente, posto inexistir prova do prejuízo alegado pela autora, em nítida afronta à norma do art. 333, I do C P Civil (fls 314/333)

 

A autora, por sua vez, bate-se pela procedência integral dos pedidos com a condenação das rés ao pagamento de indenização por danos morais (fls 353/363)

 

Tempestivos e preparados, os recursos foram recebidos (fls 365) e contra-arrazoado apenas os recursos das rés (fls 366/381 e certidão de fls 395

 

Parecer do Ministério Público, em ambas as instâncias, pela ratificação do julgado (fls 396/399 e 403/408)

 

VOTO

(N° 15.417)

 

A Televisão Globo Ltda ajuizou a presente ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por ato ilícito em face da Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo e de ML Editora de Jornais e Revistas, aduzindo, na inicial, haver esta violado seus direitos de propriedade intelectual e seus direitos autorais ao registrar, com anuência da primeira ré, dois nomes de domínio, que reproduzem sua marca, para utilização na “Internet” “jornalnacional com br” e “globoesporte com br” Pleiteou, assim, a condenação da FAPESP a proceder o cancelamento dos referidos nomes de domínio, sob pena de multa cominatória, bem como a condenação da ML Editora de Jornais e Revistas ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, acrescidas das verbas da sucumbência

 

Sobrevindo o decreto de procedência parcial, insurgiram-se os litigantes A autora pugnando pela procedência do pedido de indenização por danos morais, rejeitado em primeira instância A FAPESP insistindo na ilegitimidade passiva de parte, imputando responsabilidade apenas ao requerente do registro do “nome de domínio”, enfatizando que por delegação de competência do Comitê Gestor apenas procede ao registro dos nomes de domínio a pedido do interessado, sem assumir qualquer responsabilidade perante terceiros por fato ocorrido de natureza registraria E a Região Editora Ltda, por sua vez, aduzindo nulo o processo a partir da citação, porque não instruída a precatória com cópia da petição de aditamento à inicial, improcedente os pedidos porque reivindicada a precedência e proteção sobre marca da qual a autora não tem o registro correspondente no INPI e que, se defendo, não tem o condão de conferir a notoriedade em classe especial, mas única e exclusivamente nas áreas ligadas ao telejornalismo, porque adotado pelos órgãos de registro do domínio o princípio “first come, fim served” e, por fim, descabida a indenização por danos morais ante a ausência de prova do alegado prejuízo

 

Merece prosperar integralmente apenas o reclamo da co-ré FAPEP

 

Regra geral, bem é verdade, o critério para registro de nome de domínio na Internet é o da precedência, assegurando a quem primeiro fez o registro junto à FAPESP o direito de utilizá-lo

 

Dispõe, a propósito, o art 1o da Resolução n° 01/98 que “O registro de Nome de Domínio adotará como critério o princípio de que o direito ao nome do domínio será conferido ao primeiro requerente que satisfizer, quando do requerimento, as exigências para o registro do nome, conforme as condições descritas nesta resolução e seus Anexos”.

 

 

A própria regra de define o critério para registro de nomes de domínio, todavia, impõe ao primeiro requerente do registro o cumprimento de exigências, dentre as quais, segundo o art 2o, III, “b” do Anexo I da aludida Resolução, a de que o nome escolhido pelo requerente para registro, sob determinado DPN, esteja disponível, como tal considerado nome passível de registro E por não registrável, cita referido artigo, exemplificativamente, palavras de baixo calão, os que pertençam a nomes reservados mantidos pelo Comitê Gestor e pela FAPESP com essa condição, por representarem conceitos predefinidos na rede Internet, como é o caso do nome “Internet” em si, os que possam induzir terceiros a erro, como no caso de nomes que representam marcas de alto renome ou notoriamente conhecidas, quando requeridos pelo respectivo titular, siglas de Estados e Ministérios.

 

 

Em síntese, a regra de que o direito ao registro do nome de domínio compete aquele que primeiro o requerer encontra exceção quando os nomes possam induzir terceiros a erro, por representarem marcas de alto renome ou notoriamente conhecidas, que não foram solicitados pelo respectivo titular

 

E tal é a hipótese dos autos em que os nomes “Jornal Nacional” e “Globo Esporte”, por sua inquestionável notoriedade, remetem à Rede Globo de Televisão

 

Agiu, portanto, com acerto a douta sentenciante ao acolher o pleito de cancelamento dos registros dos nomes de domínio feitos pela FAPESP à requerimento da co-ré ML Editora de Jornais e Revistas Ltda, porquanto “não registráveis” por ela referidos nomes nos exatos termos do art 2o, III, “b” do Anexo I, da Resolução n° 01/98 e possível o seu cancelamento a teor do previsto no art 7°, V da referida resolução

 

“O objetivo de tal regra profilática. “, como bem enfatizou a nobre Juíza da causa, “… é justamente a de impedir a pirataria cibernética, coibindo a má utilização de nomes ou marcas famosas dentro da rede, bem como a sua comercialização ilegal com o intuito de obtenção de lucro fácil, através da venda ou aluguel dos nomes de domínio, por preços altíssimos, feitas para as próprias titulares dos nomes ou marcas envolvidos que pretendam preservar sua boa reputação no mercado. (fls. 359)

 

Conquanto indevido tenha sido o registro, importa ressaltar não ser o caso de se manter a FAPESP como ré, vez que nenhuma ilicitude a ela fora imputada pela autora que se limitou a postular providenciasse o necessário cancelamento do nome de domínio

 

O simples fato de o art 7o da Resolução 001/98 prever o cancelamento do registro como decorrência de ordem judicial, por ser o cancelamento mera decorrência do eventual acolhimento da ação, não autoriza a inclusão da FAPESP no pólo passivo

 

Confira-se, a propósito do tema, precedente desta Colenda Corte, relatado pelo ilustre Desembargador Waldemar Nogueira Filho enfatizando que “…a FAPESP, a exemplo do que ocorre com as Juntas Comerciais e os Serviços de Registro de Imóveis, é mero órgão de registro de nome de domínio, como soa, de resto, da Portaria Interministerial MC/MCT n° 147/95, que criou o ‘Comitê Gestor da Internet do Brasil’ com a incumbência da coordenação da atribuição de endereços IP e do registro de nomes de domínio, e da Resolução 001, de 15 de abril de 1998, que delegou competência à FAPESP ‘para realizar as atividades de registro de nomes de domínio, distribuição de endereços IPs e sua manutenção na rede eletrônica internet“‘(Agravo de Instrumento n° 411 997-4/5)

 

No mesmo sentido, julgado inserto na JTJ 253/251

 

COMINATÓRIA - Cumulação com indenização – Alegação de dano decorrente de registro de site na Internet – FAPESP (Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) — Exclusão do pólo passivo – Admissibilidade – inexistência contra ela de atribuição da prática de ato ilegal e de pedido definitivo – Inicial parcialmente indeferida — Recurso não provido”

 

Desnecessária e inapropriada a participação da FAPESP na presente demanda, resta, como conseqüência, excluí-la da condenação nos ônus da sucumbência

 

De resto, em que pese escorreito o decreto de abstenção de uso em face da ML Editora de Jornais e Revistas por haver utilizado indevidamente nomes que integram o patrimônio imaterial da autora, prospera a insurgência contra o valor arbitrado a título de indenização por danos materiais

 

Ainda que não tenha a ré se manifestado sobre os danos materiais, ofertando específica impugnação em sua peça de defesa, tal não implica, no caso, sua aceitação quanto a eles, quer por não haver sido instruída a precatória com cópia da petição de emenda à inicial mencionando expressamente o valor almejado pela autora a esse título, quer porque não restaram referidos danos devida e fartamente demonstrados Por isso, inclusive, resta prejudicada a preliminar de nulidade aventada, vez que a matéria se entrosa com o mérito das razões recursais

 

Justo assim que a apuração dos danos materiais seja feita em liquidação de sentença, tal como inclusive, pleiteado pela própria autora em sua petição inicial, antes da determinação da emenda, como forma de se resguardar os princípios do contraditório e da ampla defesa

 

No que respeita à indenização por danos morais, subsiste o julgado que a rejeitou vez que não tendo a ré ML Editora de Jornais sequer usado os nomes de domínio, terceiros não foram induzidos em engano com repercussão negativa para a imagem da autora perante o público

 

Ante o exposto, dou provimento integral ao apelo da FAPESP, com inversão dos ônus da sucumbência, dando provimento parcial ao recurso da ML Editora de Jornais e Revistas, negando-o ao da autora

 

JUSTINO/MAGNO ARAÚJO
relator

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